sexta-feira, dezembro 16, 2005

à minha Speechless, sobre o que eu achava impossível de escrever

Eu, que entendo bem esse desempacotar das malas que carregamos às costas, ainda que há muito não mude endereço postal (nem pretenda sair do 4200), tenho de te ver ir embora, como vi a Joanita ir. Com a esperança de que o Porto te lembre sempre os sotaques que se alongam da boca ao pulso com a rapidez própria de quem é do Norte e de quem a ele pertence.

Eu pertenço a esta cidade – tu sabes - uma aldeia de “costuras pouco urbanas e de buracos remendados com má caligrafia”. E para mim, é aqui que também tu vais sempre pertencer. Mesmo que deixes as ruas para trás e as leves empacotadas ou por empacotar num qualquer livro de bolso. Ou no livro de bolso.

Talvez devesse aproveitar as semanas que nos restam de Inês aqui na cidade para te dizer “anda comigo, sentir-lhe a pulsação, fazeres como os poetas e transformares este casamento de conveniência em amor à primeira vista (não era assim?).

Mas tenho medo. Confesso-te. Tenho medo, minha querida. Que somos dos animais, os poucos que sofrem as despedidas por antecipação, o fechar de um ciclo, o fechar de uma página à qual não voltamos tão cedo. Ainda que guardemos um certo poema no peito para que nos acompanhe todos os dias – buraquinhos e rasgões num casaco velho, janelinhas “para dentro no lugar dos botões”.

Os tracejados têm pouca importância. Estão lá para as manobras de quem as quer fáceis. E, principalmente, não conduzem a lugar nenhum quem já saiba para onde quer ir. Como tu, minha linda.

Mas em cidades como esta, que são de “encontros e desencontros” nós, as tuas meninas, trocámos os cheiros impessoais – os da terra, seja ela qual for - por “histórias que não precisam de chão”. Ganhamos. Nós, tu, eu. Uma cidade para levares no bolso, talvez...

PS: O tom sentimentalista destes parágrafos vem na sequência de um poema recente, do qual andei a fazer decalques para este post, por isso não ligues... A tua amiga anda tolinha...
Um dia mando-to. Talvez quando estiveres lá longe. Quando a cidade te for mais nítida - por causa do distanciamento com que vamos ver as coisas, as feridas abertas, a dor – e quando ela, a cidade, te for um Porto sim. De contrabando.
Nosso.

1 comentário:

IB disse...

as duas coisas mai bonitas de se fazer ao ler este "mail/recado/post": sorrir e chorar. um beijo