Rosas Vermelhas
Não podia deixar de cá passar hoje.
Cheguei ainda há pouco a casa. Só deu tempo para passear o piolhito do Lucas aqui pela praceta.
Pai, mãe, avó, tio, tias, primo, antigos amigos, amigos novos, gente que me viu crescer. Ali. Ali perto da Tabacaria Sampaio a ler revistas de desenhos animados à socapa para não ter de as pagar com o troco que me era destinado depois de o meu pai comprar os jornais e tomar café no Grão D’Ouro. Ali ao pé da mercearia que cheirava a morangos frescos e que tinha sempre um espacinho na montra para mais um poema rabiscado em papel A4 e fotocopiado também à socapa na farmácia da minha mãe. Ali ao pé da casa da avó Manuela (avó Manuela para mim, que para os outros era a escritora Manuela Monteiro) onde ia volta e meia despejar as minhas angústias de adolescente em formato de verso e que ainda hoje guarda um caderno anotado à mão dos poemas de que mais me orgulhava. A mesma avó Manuela que esta noite, em vez de me oferecer rosas brancas, se “decidiu pelas rosas vermelhas”, “porque a Minês hoje já é uma mulher”.
Como é que eu lhe explico que é com ela que aquele caderno deve ficar, que não foi esquecido lá na casa com a entrada dos tijolos vermelhos, que lá foi deixado de propósito? Ou melhor, com um propósito...
Ainda estou para saber como é que me contive hoje de dar numa de “maria madalena” e desatar aos prantos no meio daquela sala famalicense.
As minhas meninas pregaram-me uma partida. Eu pus-me a jeito – é certo. Mas não esperava comover-me tanto. Não, não esperava. Não esperava ter os olhos a inundarem-se-me de lágrimas de felicidade por poder compartilhar o sonho de uma vida com as minhas meninas. Não sabia como seria ouvir aqueles poemas pelas vossas vozes. Não esperava, em boa verdade, trazer nunca o Plasticidades ao pequeno mundinho que me viu crescer com tanto carinho. Foi uma honra estar sentada naquelas cadeiras (em spotlight improvisado, mas com umas luzes poderosas – chiça, que ainda agora estou a ver um bocadinho mal) convosco esta noite.
E não, não me importa se estou a ser lamechas demais. Não quero saber. Para completar a coisa só faltava adormecer agora, sabendo que amanhã de manhã bem cedinho vos ía encontrar no balcão do Caloirinho, a descarregar as mochilas com os pc’s à porta, a pedir um café curto à D. Isabel, a fumar o primeiro cigarro do dia e a rir que nem perdidas com os pormenores que escaparam umas da outras. Mas não posso.
O que vos posso dizer neste momento, ainda sob o encantamento da alegria desta noite, é que o meu sonho foi cumprido. Pelas vossas mãos. E estava lá tudo apontadinho, num caderno azul velhinho na casa da Avó Manuela.
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